
A mudança veio em boa hora, como demonstrei nos posts "O TSE errou ao dizer que a rejeição de contas impedirá a candidatura" e "A rejeição de contas impedirá a candidatura para as eleições 2012"
Mas nem todo mundo gostou da nova postura moralizadora em relação à prestação de contas. Não é muito difícil advinhar quem...
Não
satisfeitos com o novo posicionamento da Justiça Eleitoral, os parlamentares
resolveram enfrentar o assunto. O Projeto de Lei n.3839/2012, de autoria do Dep. Roberto
Balestra, acrescenta o inciso III ao art. 11, §8º,
e o §5º ao art. 30, todos da Lei 9504/97. Eis os dispositivos:
“Art. 11. § 8º Para fins de expedição da certidão de que trata o § 7o, considerar-se-ão quites aqueles que:
III – apresentarem à Justiça Eleitoral a prestação de contas de campanha eleitoral nos termos desta Lei, ainda que as contas sejam desaprovadas”.
Art.30.
§ 5º. A decisão que desaprovar as contas sujeitará o candidato
unicamente ao pagamento de multa no valor equivalente ao das
irregularidades detectadas, acrescida de 10 % (dez por cento)”.
Como se vê, pretende-se que a rejeição
de contas não gere efeito nenhum quanto à obtenção da certidão
de quitação eleitoral. Estaria o candidato sujeito exclusivamente
ao pagamento de multa. O
projeto já passou na Câmara dos Deputados. Para transformar-se em
lei, precisa ainda ser aprovado pelo Senado e sancionado pela
Presidente da República.
Os argumentos para aprovar a lei são fraquíssimos. Dizem os congressistas que os candidatos serão punidos porque as prestações de contas são um procedimento complexo demais. Não são. O TSE, em suas resoluções, especifica todos os documentos que precisam ser juntados e fornece um formulário a ser preenchido. Acrescente-se que a prestação de contas pode ser apresentada pelo comitê financeiro da campanha, o que acaba com o argumento de que "há candidatos sem recursos para pagar assessoria". Tem mais: vícios meramente formais não impedem a aprovação de contas, mas somente os que de fato impossibilitam o exame dos gastos e da arrecadação dos candidatos. A jurisprudência do TSE é absolutamente condescendente com esses vícios. Quase todos são considerados "meramente formais". Para ter as contas rejeitadas, os candidatos precisam fazer muita, mas muita força. Se o candidato não está pronto sequer para organizar suas contas, estaria para representar o povo?
É
importante destacar um ponto: ainda que a alteração da legislação
pretendida pelos parlamentares seja feita, não deverá valer para as
eleições de 2012. Segundo
o art. 16 da Constituição Federal, “a lei que alterar o processo
eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se
aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua
vigência”. Estamos diante do chamado princípio da anualidade do
direito eleitoral. Ao julgar se a Lei Complementar 135/2010, a Lei da Ficha Limpa,
seria aplicável às eleições de 2010, ano em que entrou em vigor,
o STF, por 6 votos a 5, decidiu que “por
interferir na fase da escolha e apresentação das candidaturas”,
a lei deveria obedecer ao princípio da anualidade(Recurso Extraordinário
633703, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 23/03/02011). Por isso,
decidiu o STF que a LC 135/2010 só valeria a partir das eleições
2012. Se essa tese valeu para impedir a aplicação da Lei da Ficha
Limpa em 2010, também impedirá que seja aplicado em 2012 o perdão
pretendido pelo Congresso a quem teve as contas rejeitadas. Afinal, o
Projeto de Lei 3839/2012, ao tratar de condições que precisam ser
preenchidas por quem quer ser candidato, interfere tanto na fase de
escolha e apresentação das candidaturas quanto a LC 135/2010.
O lamentável é que com a reforma pretendida por suas Excelências a prestação de contas continuará sendo completamente inútil. O circo se repete: os candidatos fingirão que expõem suas contas e a Justiça Eleitoral fingirá que as analisa. Adivinha, e-leitor, quem são os palhaços? Tenho a impressão de que não gostaremos da resposta...