No último informativo do STF, há dois casos de interesse aos operadores do Direito Eleitoral. O primeiro deles é o indeferimento de pleito feito em medida cautelar em ADI (ADI 5311-MC/DF, Rel. Min. Carmém Lúcia), para suspender a eficácia do art 2 da Lei 131107/2015, no trecho em que altera os arts. 7º e 29 d Lei dos Partidos Políticos. O segundo consiste no julgamento procedente do pedido formulado em ação
direta para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 1º e 2º da Lei
12.875/2013. Tais dispositivos, ao promoverem alterações nas Leis 9.096/1995 e
9.504/1997, restringem, aos novos partidos políticos, criados após a
realização das eleições para a Câmara dos Deputados, qualquer acesso aos
recursos do Fundo Partidário, bem como qualquer tempo destinado a
propaganda eleitoral. Abaixo, a cópia do informativo:
O Plenário, por maioria, indeferiu pedido formulado em medida cautelar
em ação direita de inconstitucionalidade, ajuizada em face do art. 2º da
Lei 13.107/2015, na parte que alterara os artigos 7º e 29 da Lei dos
Partidos Políticos [“Art. 2º Os arts. 7º, 29 e 41-A da Lei no 9.096, de
19 de setembro de 1995, passam a vigorar com as seguintes alterações:
‘Art. 7º § 1º Só é admitido o registro do estatuto de partido político
que tenha caráter nacional, considerando-se como tal aquele que comprove
o apoiamento de eleitores não filiados a partido político,
correspondente a, pelo menos, 0,5% (cinco décimos por cento) dos votos
dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não
computados os votos em branco e os nulos, distribuídos por 1/3 (um
terço), ou mais, dos Estados, com um mínimo de 0,1% (um décimo por
cento) do eleitorado que haja votado em cada um deles.’ ‘Art.29 (...) §
9º Somente será admitida a fusão ou incorporação de partidos políticos
que hajam obtido o registro definitivo do Tribunal Superior Eleitoral
há, pelo menos, 5 (cinco) anos.’”]. O Tribunal esclareceu que a
Constituição asseguraria a liberdade de criação, fusão, extinção e
incorporação de partidos políticos, como expressão do princípio
democrático e do pluripartidarismo (CF, art. 17). Portanto, estaria
garantida no ordenamento jurídico-constitucional a liberdade dos
partidos políticos de se articularem, desde que observada a
imperatividade do caráter nacional das agremiações — controle
quantitativo — e do cunho democrático de seus programas — controle
qualitativo ou ideológico. Destacou que a necessidade de aperfeiçoamento
do controle quantitativo e qualitativo dos partidos justificaria o
advento das normas impugnadas. Observou que haveria agremiações
intituladas formalmente como partidos políticos sem qualquer substrato
eleitoral. Essas legendas estariam habilitadas a receber parcela do
fundo partidário e a disputar tempo de televisão sem difundir, contudo,
ideias e programas. Elas atuariam em deferência a outros interesses
partidários, especialmente para obtenção de vantagens particulares para
os seus dirigentes. Esses partidos seriam objeto de comércio em que se
venderiam interesses e se pagaria com futuro.
ADI 5311-MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 30.9.2015. (ADI-5311)
A Corte asseverou que a imperatividade de urgente legitimação dos
partidos também decorreria de seu acesso ao Fundo Partidário, dinheiro
público a que fariam jus. As verbas desse Fundo teriam assumido
importância nuclear para a sobrevivência dos partidos e, mesmo em tempos
de depressão econômica, houvera vultoso aumento desses valores. Assim, o
aperfeiçoamento dos mecanismos de controle quantitativo e qualitativo
na formação dos partidos, buscado na legislação questionada, assumiria
também a função de tutela do princípio da eficiência administrativa dos
recursos públicos, na medida em que, sem coibir a formação de novas
agremiações, lhes atribuiria maior expressividade, de modo a estancar
gastos públicos vultosos, seja na repartição do fundo partidário, seja
pelo acesso aos horários de propaganda em rádio e televisão, também
subsidiados pelo contribuinte. Frisou que a proliferação indiscriminada
de partidos sem coerência ou respaldo social importaria em risco
institucional e conduziria ao desalento democrático. Além disso, poderia
transformar o sadio pluripartidarismo em caos político. Salientou que
as normas analisadas teriam como fundamento a tentativa de incentivar a
utilização de mecanismos da democracia representativa, a reforçar a
legitimidade e o compromisso do eleitor e do partido no qual se
depositara o seu aval. Ademais, a fidelidade partidária irradiaria
efeitos a alcançar todos os filiados, já que as exigências democráticas
que vinculariam o funcionamento interno dos partidos atingiriam não
apenas os filiados mandatários como também a base. Realçou que a
limitação criada pela norma em análise, quanto ao apoio para a criação
de novos partidos, a qual ficaria restrita aos cidadãos sem filiação
partidária, estaria em conformidade com o regramento constitucional
relativo ao sistema representativo.
ADI 5311-MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 30.9.2015. (ADI-5311)
O Tribunal consignou, ainda, que a exigência temporal para se levar a
efeito fusões e incorporações entre partidos asseguraria o atendimento
do compromisso do cidadão com a sua opção partidária, o que evitaria o
estelionato eleitoral ou a reviravolta política contra o apoio dos
eleitores, então filiados. Na espécie, a norma distinguiria cidadãos
filiados e não filiados para o exclusivo efeito de conferência de
legitimidade do apoio oferecido à criação de novos partidos políticos. O
objetivo único seria a garantia de coesão, coerência e substância ao
modelo representativo instrumentalizado pela atuação partidária.
Trataria, portanto, de cidadãos distintos em seu exercício cívico, livre
em relação a suas opções políticas. Assim sendo, constitucionalmente
livres, não seriam civicamente irresponsáveis nem descomprometidos com
as suas escolhas formalizadas. Além disso, o descompromisso com a
atuação política atingiria todos em uma sociedade. A disseminação de
práticas antidemocráticas que iriam desde a compra e venda de votos ao
aluguel de cidadãos e de partidos inteiros deveriam ser combatidas pelo
legislador, sem prejuízo da autonomia partidária. Portanto, as normas
objurgadas tenderiam a enfraquecer essa lógica mercantilista e nada
republicana de prática política. Concluiu que não se teria demonstrado,
na hipótese dos autos, ingerência estatal na autonomia constitucional
dos partidos políticos. Vencido o Ministro Dias Toffoli, que concedia a
medida cautelar para suspender, com efeito “ex nunc”, a eficácia dos
dispositivos atacados por julgá-los incompatíveis com a disciplina do
art. 17 da CF.
ADI 5311-MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 30.9.2015. (ADI-5311)
O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação
direta para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 1º e 2º da Lei
12.875/2013, que, ao promoverem alterações nas Leis 9.096/1995 e
9.504/1997, restringem, aos novos partidos políticos, criados após a
realização das eleições para a Câmara dos Deputados, qualquer acesso aos
recursos do Fundo Partidário, bem como qualquer tempo destinado a
propaganda eleitoral. De início, o Colegiado destacou que as disposições
ora impugnadas decorreriam de superação legislativa da interpretação
conferida pelo STF ao art. 47, § 2º, II, da Lei 9.504/1997 (ADI
4.430/DF, DJe de 19.9.2013 e ADI 4.795/DF, DJe de 30.10.2013). Na
oportunidade, o Tribunal dera interpretação conforme ao preceito
questionado, para salvaguardar aos partidos novos, criados após a
realização de eleições para a Câmara dos Deputados, o direito de acesso
proporcional aos dois terços do tempo destinado à propaganda eleitoral
gratuita no rádio e na televisão. Poucos meses após o julgamento dos
casos supracitados, o Congresso editara a Lei 12.875/2013 que, em
sentido oposto ao pronunciamento da Corte, subtraíra dessas novas
legendas o acesso aos recursos do Fundo e ao direito de antena. Caberia
perquirir, portanto, quais os limites de reações legislativas a decisões
proferidas pelo STF, tendo em vista o impacto na esfera de liberdade de
conformação do legislador. Nesse sentido, o Tribunal deteria a última
palavra no que se refere à interpretação da Constituição, imune a
qualquer controle democrático. Não se ignoraria, entretanto, a
legitimidade, em algumas hipóteses, do ativismo congressual, ou seja, de
reversão legislativa a decisões da Corte, desde que observadas algumas
balizas constitucionais. Nesses casos, o Legislativo buscaria reverter
situações de autoritarismo judicial ou de comportamento antidialógico,
incompatível com a separação de poderes. Ao legislador seria, assim,
franqueada a capacidade de interpretação da Constituição, a despeito de
decisões de inconstitucionalidade proferidas pelo STF. Seria possível
extrair as seguintes conclusões a respeito do tema: a) o Tribunal não
subtrai “ex ante” a faculdade de correção legislativa pelo constituinte
reformador ou pelo legislador ordinário; b) no caso de reversão
jurisprudencial via emenda constitucional, a invalidação somente
ocorrerá nas hipóteses estritas de ultraje aos limites do art. 60 da CF;
e c) no caso de reversão jurisprudencial por lei ordinária, excetuadas
as situações de ofensa evidente ao texto constitucional, a Corte tem
adotado comportamento de autorrestrição e de maior deferência às opções
políticas do legislador.
ADI 5105/DF, rel. Min. Luiz Fux, 1º.10.2015. (ADI-5105)
O Tribunal assinalou que seria prudente não se atribuir a qualquer
órgão, fosse do Judiciário, fosse do Legislativo, a faculdade de
pronunciar, em solução de definitividade, a última palavra sobre o
sentido da Constituição. O próprio texto constitucional desafiaria esse
entendimento. Em primeiro lugar, os efeitos vinculantes das decisões
proferidas em sede de controle abstrato não atingem o Legislativo (CF,
artigos 102, § 2º; e 103-A), de modo a ser perfeitamente possível a
edição de emendas constitucionais ou leis ordinárias acerca do assunto
objeto de pronunciamento judicial. Em segundo lugar, o dever de
fundamentação das decisões judiciais (CF, art. 93, IX), impõe que o STF,
mesmo nas hipóteses de correção legislativa de sua jurisprudência,
enfrente a controvérsia à luz dos novos argumentos expendidos pelo
legislador para reverter o precedente. Além disso, desconsiderar que as
demais instituições sejam intérpretes autorizados da Constituição
poderia propiciar certa acomodação ou desinteresse nos demais atores em
interpretar o texto constitucional. Ademais, a perspectiva juriscêntrica
de hermenêutica constitucional também estimula comportamentos
irresponsáveis na conformação da Constituição pelo legislador. Assim, o
STF deveria proceder como catalisador deliberativo, promovendo a
interação e o diálogo institucional, de modo a maximizar a qualidade
democrática na obtenção dos melhores resultados em termos de apreensão
do significado constitucional. Portanto, o legislador poderia, por
emenda constitucional ou lei ordinária, superar a jurisprudência,
reclamando posturas distintas da Corte. Se veiculada por emenda,
altera-se o próprio parâmetro amparador da jurisprudência. Nessas
situações, a invalidade da emenda somente poderá ocorrer nas hipóteses
de descumprimento do art. 60 da CF. Se, porém, introduzida por
legislação ordinária, a norma que frontalmente colidir com a
jurisprudência do Tribunal nasce com presunção de inconstitucionalidade,
de sorte que caberia ao legislador o ônus de demonstrar,
argumentativamente, que a correção do precedente se afigura legítima, e
que o posicionamento jurisprudencial deve ser superado, tendo em conta
novas premissas fáticas e jurídicas. Assim, a novel legislação que
frontalmente colidisse com a jurisprudência se submeteria a um
escrutínio de constitucionalidade mais rigoroso.
ADI 5105/DF, rel. Min. Luiz Fux, 1º.10.2015. (ADI-5105)
O Colegiado apontou que, no caso em debate, a análise da justificação do
projeto de lei que desaguara na norma supracitada revelaria a inaptidão
dos fundamentos ali expendidos para legitimar a reversão da
interpretação fixada pelo STF na matéria. Os fundamentos seriam: a) as
migrações que ocorrem durante a legislatura vulneram a previsibilidade
institucional na distribuição dos recursos dos fundos partidários e do
horário de propaganda; b) essas alterações geram um cenário de
insegurança jurídica; c) a medida legislativa visa a valorizar os
partidos políticos, de modo a evitar disfunções no sistema partidário;
d) perenidade do partido enquanto instrumento do pluralismo político; e
e) o art. 17, § 3º, da CF seria observado com a distribuição equitativa
dos 5% dos recursos do Fundo Partidário e do 1/3 do horário de
propaganda eleitoral. Não haveria, no projeto, enfrentamento aos
fundamentos das ações diretas de inconstitucionalidade referidas, e os
argumentos não seriam capazes de infirmar a tese então exarada pela
Corte. Na oportunidade, o Plenário asseverara que o art. 17 da CF, que
consagra o direito político fundamental da liberdade de criação de
partidos, tutela, igualmente, as agremiações que tenham representação no
Congresso, sendo irrelevante perquirir se essa representatividade
resulta da criação de nova legenda no curso da legislatura. Além disso,
também ficara consignado que erigir a criação de novos partidos como
hipótese caracterizadora de justa causa para as migrações partidárias,
somada ao direito constitucional de livre criação de novas legendas,
impõe a conclusão inescapável de que é defeso privar as prerrogativas
inerentes à representatividade política do parlamentar. Por sua vez, a
justificação do projeto de lei se limitara a afirmar, genericamente, que
a regulamentação da matéria, excluindo dos partidos criados o direito
de antena e o Fundo Partidário, fortaleceria as agremiações, sem
enfrentar os fundamentos das ações diretas. Portanto, a
inconstitucionalidade das normas em questão se agrava, porquanto a
decisão do STF fora ancorada em sólida construção argumentativa calcada
em cláusulas pétreas. Em tese, a nova legislação que afrontasse decisões
do Tribunal nasceria com presunção relativa de inconstitucionalidade,
mas, na espécie, a inconstitucionalidade da lei seria evidente.
ADI 5105/DF, rel. Min. Luiz Fux, 1º.10.2015. (ADI-5105)
O Plenário reputou, também, que as normas em debate seriam
inconstitucionais por afrontarem as condições de funcionamento das
instituições democráticas. A restrição imposta pela nova lei às novas
legendas justificaria a intervenção do STF, pois se cuidaria de
tentativa de inviabilizar os canais de acesso e de participação daqueles
que estão fora do jogo democrático. Seria dever da Corte otimizar e
aperfeiçoar o processo democrático, de sorte a: a) corrigir as
patologias que desvirtuem o sistema representativo, máxime quando
obstruam as vias de expressão e os canais de participação política; e b)
proteger os interesses e direitos dos grupos políticos minoritários,
cujas demandas dificilmente encontram eco nas deliberações majoritárias.
A discussão acerca dos critérios de distribuição dos recursos do Fundo
Partidário e do horário de propaganda eleitoral encerram importantes
ferramentas de viabilização e desenvolvimento dessa engenharia
democrática, impactando decisivamente no pleito eleitoral. Com a
imposição de severas limitações ao Fundo Partidário e ao direito de
antena, as novas agremiações seriam alijadas do processo político. Por
esses motivos, a reação jurisprudencial materializada na Lei
12.875/2013, ao subtrair dos partidos novos, criados no curso da
legislatura, o direito de antena e o acesso a recursos do Fundo
Partidário remanesceria eivada de inconstitucionalidade, na medida em
que, além de o legislador não ter logrado trazer novos e consistentes
fundamentos para infirmar o pronunciamento da Corte, o diploma
inviabiliza, no curto prazo, o funcionamento e o desenvolvimento de
minorias político-partidárias, em ofensa aos postulados do pluralismo
político e da liberdade partidária (CF, art. 17, § 3º). Vencidos os
Ministros Edson Fachin, Teori Zavascki, Gilmar Mendes, Celso de Mello e
Ricardo Lewandowski (Presidente), que julgavam o pedido improcedente.
ADI 5105/DF, rel. Min. Luiz Fux, 1º.10.2015. (ADI-5105)