segunda-feira, 16 de abril de 2012

O TSE errou ao dizer que a rejeição de contas impedirá a candidatura?

 Partidos e candidatos devem prestar contas à Justiça eleitoral expondo a receitas e gastos da campanha eleitoral. Quem se negasse a prestá-las não poderia obter quitação eleitoral necessária à candidatura. Porém, quem as apresentasse e tivesse as contas rejeitadas, por maiores que fossem os vícios nelas presentes, teria direito à quitação. Concorda com esse tratamento, e-leitor? Não? Boas novas:  para as eleições de 2012, o TSE modificou a regulamentação da matéria. 
     
     A Resolução 23376/2011 determina  que a rejeição das contas impedirá a obtenção da quitação eleitoral (art. 52, §2º), sem a qual não é possível ser candidato. Quem teve as contas rejeitadas já está sendo chamado de “contas-sujas”(ecos da Lei da Ficha Limpa...)  O impedimento de quitação em virtude de rejeição de contas previsto na Res. 23376/2011 correponde à mudança de 180 graus em relação à recente jurisprudência do TSE.  
     No RESPE 153164-MT, por exemplo, o TSE, por 4x3, afirmou que “o § 7º do artigo 11 da Lei nº 9.504/1997, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 12.034/2009, inovou, no que tange à quitação de obrigações eleitorais, ao dispor que a mera apresentação de contas de campanha eleitoral bastaria para a expedição de certidão de quitação eleitoral”. Acrescentaram os ministros que “a desaprovação ou a não oportuna apreciação das contas não poderiam acarretar falta de quitação eleitoral, a impedir o registro de candidatura a novo cargo eletivo”.  
     Eis o teor do dispositivo que fundamentou o julgado: 
§ 7o A certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a apresentação de contas de campanha eleitoral.  
     A posição de que rejeição de contas não impediria obtenção de quitação baseia-se no fato de que o artigo afirma que a certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente “a apresentação de contas de campanha eleitoral". Os críticos dizem que, com a nova Resolução,  o TSE desrespeitou os limites de seu poder normativo, pois seria impossível em resolução agregar à desaprovação o mesmo efeito dado pela Lei 9504/97 exclusivamente à não apresentação. Ocorre que a legislação não tem esse restritíssimo alcance que lhe foi dado nos julgamentos acima. Vejamos.   
     Não podemos esquecer que o direito, como toda linguagem, é um sistema de elementos coerentes que guardam entre si relação de não contradição. É absolutamente incoerente considerar a que a não apresentação de contas poderia impedir a quitação e a desaprovação não. É que naquela sequer se comprovou efetivamente que vício severo ocorreu, o que ocorre nos procedimentos de prestação de contas findados com decisão de rejeição.   
     Há mais. Na rejeição de contas, o candidato  pode ser punido com sanções que não atingirão quem não as prestar no momento adequado, como o recolhimento ao fundo partidário dos valores oriundos de fontes vedadas. Afinal, aquele que teve as contas declaradas não prestadas e depois as apresenta à Justiça Eleitoral, terá a situação regularizada para a próxima legislatura.   
     Nota-se que a rejeição é sancionada mais severamente que a não apresentação. Parece, diante desse quadro, evidente que a carga valorativa negativa a ser dada à rejeição é maior que à não apresentação. Por isso, descabido presumir que o efeito quanto à obtenção da quitação viria somente para quem não prestasse contas. 
     Na realidade,  em benefício da coerência do sistema, o art. 11, § 7o da Lei 9504/97 há de ser interpretado em conjunto o art. 30, o qual assevera que “A Justiça Eleitoral verificará a regularidade das contas de campanha”Nesse ponto, precisas as lições do Min. Marco Aurélio ao referir-se ao art. 11, § 7o no seu voto no RESPE 153164MT, acompanhado por Lewandowsky e Nancy Aldrigh. Afirmou ele que a referência à apresentação de contas é feita não apenas para se atender a um apecto formal, mas para se perquerir sobre a harmonia ou não dessas contas com o ordenamento jurídico. E arrematou:
"É possível afirmar, potencializando-se apenas o aspecto formal em detrimento do fundo, ser suficiente dirigir-se ao protocolo da Justiça Eleitoral e apresentar contas, pouco importando a boa ou a má procedência delas? A finalidade da norma não é essa, a menos que também se assente que, apresentadas as contas, haja o exaurimento do dever do candidato, sem a necessidade sequer do pronunciamento da Justiça Eleitoral sobre a regularidade (…) Senhor Presidente, não consigo emprestar ao § 70do artigo 11 da Lei n° 9.50411997 sentido limitativo quanto aos elementos conducentes a obter-se a certidão de quitação eleitoral. A rejeição das contas está compreendida no preceito como fator determinante para não se alcançar a certidão de quitação. A referência a esta, contida no início do preceito, norteia o alcance da parte final, da expressão "apresentação de contas".
      Vê-se que a nova Resolução não inovou em nada ao dar à rejeição o mesmo efeito da não apresentação. Simplesmente trouxe exigência já prevista em lei. Não há que se falar, portanto, em extrapolamento dos limites do poder normativo pelo TSE.  A dúvida que se põe agora é: a exigência valerá já para as eleições de 2012? Ou as rejeições de contas gerarão efeitos só em 2014? Veremos isso no próximo post. 

2 comentários:

Régis disse...

Dr. Rodrigo, não consigo encontrar esse acórdão no TSE. Você poderia disponibilizar o link do inteiro teor dele, por gentileza? Grato.

Rodrigo Tenório disse...

Régis,
Não consigo postar links para inteiro teor de julgado do TSE. Para achar qualquer acórdão, vá à página "Pesquisa de Jurisprudência " e digite o número do processo que citei no post. Atenciosamente,
Rodrigo Tenório

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