sábado, 12 de setembro de 2020

O impacto da reforma administrativa para os atuais servidores

 


Diversamente do que se tem propagado, a PEC 32/2020, a da Reforma Administrativa, atinge em cheio os atuais servidores. Dispõe seu art. 2o que “ao servidor público investido em cargo efetivo até a data de entrada em vigor do regime jurídico de que trata o art. 39-A da Constituição  é  garantido regime jurídico específico, assegurados: I) a estabilidade, após três anos de efetivo exercício e aprovação em estágio probatório; II)  a não aplicação do disposto no art. 37, caput, inciso XXIII, alíneas “a” a “j”, da Constituição na hipótese de haver lei específica vigente em 1o de setembro de 2020 que tenha concedido os benefícios ali referidos, exceto se houver alteração ou revogação da referida lei; e III) os demais direitos previstos na Constituição.

 

O regime jurídico de que trata o art. 39-A, citado no art. 2o, é aquele que compreende o vínculo de experiência, vínculo provisório e a figura do cargo típico de Estado (ainda a ser definida). Já as alíneas “a” a “j” do art. 37, XXIII, que não se aplicariam aos servidores de hoje, referem-se à vedação de benefícios como licença-capacitação, progressão por tempo e adicional de substituição. O art 2o é a única regra de transição que traz a PEC. Preservada a estabilidade nos moldes vigentes  a mantidos os benefícios da carreira, parece, a princípio, que os servidores atuais estariam salvos dos impactos da PEC 32, certo? Errado.

 

Comecemos pela avaliação de desempenho prevista no art. 41. Atualmente, já há previsão dessas avaliação pelo art. 41 da CF, a qual deveria ser regida por lei complementar. A PEC não estabelece critério nenhum para a avaliação e determina no art. 41-A, que será regida por lei ordinária. Tal lei será aplicável a todos os servidores, inclusive os atuais, nos termos do parágrafo primeiro do novo  art. 41 e do art. 2o da PEC.

 

No novo art. 84, que amplia os poderes do Presidente da República, também há consequências para os servidores atuais, e não só os do Executivo. Permite-se que por Decreto, ato expedido pelo Presidente, ele possa, quando não implicar aumento despesa, dispor sobre extinção de autarquias e fundações; alterar  e reorganizar os cargos efetivos do Poder Executivo Federal e suas atribuições desde que não implique alteração ou supressão da estrutura da carreira ou alteração da remuneração, dos requisitos de ingresso no cargo ou da natureza do vínculo; criação, fusão, transformação ou extinção de Ministérios e de órgãos diretamente subordinados ao Presidente da República, observado o disposto no art. 88.

 

Se o presidente pode extinguir autarquias e fundações – ocupadas, obviamente, pelos que hoje já integram o serviço público -  e pode reorganizar as atribuições dos cargos dos servidores atuais, como defender que a reforma não os atinge? Promulgada a PEC, poderia, a princípio, o presidente, sem o Congresso, extinguir autarquias inteiras, como o IBAMA ou alterar as atribuições de cargo que foram postas em lei pelo Congresso Nacional. Parece que aqui há ofensa à cláusula pétrea da separação de poderes posta no  art. 60, § 4º, III, da CF consubstanciada pela concentração exagerada de poderes nas mãos do Presidente da República em detrimento do Poder Legislativo. Cargos e autarquias hão de ter seus limites postos em manifestação do Congresso Nacional. O modelo constitucional vigente outorga ao Presidente da República a iniciativa privativa de iniciar o processo legislativo no (art. 84,II) nos casos previstos na Constituição. De seu turno, o art. 61, II, “a” e “e” dá-lhe iniciativa privativa nos projetos de lei que disponham sobre organização administrativa, criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração Pública. Cabe ao Presidente iniciar o processo legislativo; ao Congresso, a decisão final do tema. O equilíbrio de poderes será claramente violado caso o poder do presidente passasse de iniciativa de provocar ao Congresso à absorção de suas funções.

 

 

 

O art. 247, com a redação dada pela PEC, reza que “as leis previstas no inciso III do § 1o do art. 41 e no § 7o do art. 169 estabelecerão critérios e garantias especiais para a perda do cargo pelo servidor público investido em cargo típico de Estado”. Possibilita o art. 169 que o servidor, estável ou não, perca o cargo para que sejam cumpridos os limites de gastos estabelecidos em lei complementar. Veja-se que o parágrafo sétimo introduzido pela PEC destaca que os servidores públicos investidos em cargo típico de Estado também poderão perder seus cargos para o cumprimento do limite, garantindo-lhe garantias especiais. Os demais servidores, ainda que estáveis na data de hoje, não terão “garantia especial” alguma. 

Não se iluda, servidor.  Você será sim afetado pela redação atual Reforma Administrativa, por mais que tentem te convencer do contrário.

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