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No nosso último encontro(clique aqui), prometi que descreveria como as eleições indiretas, se Temer fosse cassado, ocorreriam. Promessa é dívida, e deixarei hoje de ser devedor. Tratarei do tema em dois posts, respondendo três questões em cada um deles.
Fixemos, desde já, algumas premissas. Como juspositivista, importam-me somente as normas vigentes. Não vou extrair regras regedoras da eleição a partir de princípios amplíssimos como "dignidade humana" ou "soberania popular". As eventuais lacunas aparentes serão supridas pela interpretação integrativa (analogia) e declarativa, como ensina Bobbio(1). Levarei em conta, ainda, a coerência - a qualidade de não ostentar contradições internas - do sistema jurídico. Dito isso, mãos à obra.
1) Quem será o responsável por realizar a eleição indireta?
Nos termos do art.
81, §1º da CF, "ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período
presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da
última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei". Vê-se que o Congresso terá a responsabilidade pela eleição. Dela se desincumbirá por meio do órgão que dirige seus
trabalhos legislativos e administrativos: a Mesa do Congresso
Nacional.
Composta por senadores e deputados, a Mesa é presidida pelo
Presidente do Senado Federal. Os demais cargos serão exercidos,
alternadamente, pelos ocupantes de cargos equivalentes na Câmara dos Deputados e
no Senado(art 57 da CF). Se a presidência é do Senado, o 1º Vice-Presidente da Câmara dos
Deputados será o 1º Vice-Presidente do Congresso Nacional; o 2º
Vice-Presidente do Senado será o 2º Vice-Presidente do Congresso Nacional, e
assim por diante.
Note-se que o art. 81, §1º, da Constituição assegura que as eleições indiretas serão feitas "na forma da lei". Nenhuma lei sobre o tema foi publicada desde que promulgada a CF/88. Isso não significa que estamos de mãos vazias. Usaremos a Lei 4321/64, que já tratava de eleições presidenciais indiretas há mais de 50 anos. Os artigos da lei que não foram revogados e os que foram recepcionados pela constituição vigente nos servirão.
Conforme o art. 2º da Lei 4.321/64, o Presidente do Senado convocará a eleição mediante edital publicado no Diário do Congresso Nacional,
com a data e hora da sessão. Aplicando-se analogicamente a norma constitucional relativa
à eleição dos Presidentes da Câmara e do Senado (art.57, §4º) e o art. 6º da Lei 4.321/64, conclui-se que a
sessão terá como propósito exclusivo a eleição indireta, não podendo nela outro tema ser deliberado.
A Mesa do Congresso receberá as inscrições das chapas, tomará os votos, organizará a apuração, divulgará
os resultados e dará posse aos eleitos.
2) Quem poderá votar?
Votarão os integrantes das duas casas do Congresso, Câmara e Senado, os quais formarão colégio de eleitores único. Vale o princípio do “one man, one vote”. Não
há distinções entre os votos dos senadores e deputados, ainda que
os primeiros sejam apenas 81 e os segundos, 513.
3) Quem poderá disputar a eleição?
Nas eleições diretas, disputará o pleito quem obtiver o registro de
candidatura, como bem ensina o professor Adriano Soares. Para conceder o registro, a justiça eleitoral analisa se estão presentes as condições de elegibilidade e ausentes hipóteses de inelegibilidade.
Não há nada parecido com procedimento de registro de candidatura nas eleições indiretas. Haverá mera inscrição de chapa perante a Mesa do Congresso. Isso não significa que a Mesa não tenha que analisar se os componentes da chapa ostentam as
condições de elegibilidade e se sobre eles não pesa inelegibilidade. Alguns dos requisitos positivos são os seguintes:
a) nacionalidade brasileira;
g) desincompatibilização;
Não é necessário ser parlamentar para disputar a eleição, mas é preciso ser filiado a partido.
Quanto ao item "g", a desincompatibilização, o art. 14, §6º, da CF prevê que para concorrerem a outros cargos, os Governadores e os Prefeitos devem
renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito. A LC
64/90 no art. 1°, II, também exige que ocupantes de cargos, emprego ou funções públicas(e algumas privadas)
deles se afastem, em prazos variados, antes de concorrer às eleições. Aquele que concretizar o afastamento terá feito
a desincompatibilização e, poderá candidatar-se.
Você deve estar se perguntando, e-leitor: se ninguém sabia que essa eleição ocorreria, como os interessados poderiam cumprir os prazos? O TSE já decidiu que o prazo de desincompatibilização em eleições suplementares - as feitas após anulação de um pleito - poderia ser flexibilizado. Estabeleceu o TSE que o prazo poderia ser reduzido para, por exemplo, 24 horas depois da escolha em convenção(RESPE 35254, julgado em 31.03.09). Ressalva importante: o STF, em repercussão geral, no RE 843455, resolveu que "as hipóteses de inelegibilidade previstas no art. 14, §7º, da
Constituição Federal, inclusive quanto ao prazo de seis meses, são
aplicáveis às eleições suplementares". O dispositivo determina que são inelegíveis, "no território de jurisdição do
titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou
por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território,
do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis
meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à
reeleição."
As inelegibilidades estão previstas tanto na CF, no art 14, e na LC 64/90, no art 1º, I a VII. Dentre elas, estão a rejeição de contas por ato de improbidade administrativa, a condenação, por órgão colegiado ou com trânsito em julgado, pela prática de determinados crimes, por compra de voto e por abuso de poder econômico durante a eleição.
1.
BOBBIO, Norberto. O
positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 1995,
p. 214.
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