domingo, 17 de abril de 2016

O TSE e o voto walking dead




O parágrafo único do art. 16-A da Lei 9504/97 determina que “o cômputo, para o respectivo partido ou coligação, dos votos atribuídos ao candidato cujo registro esteja sub judice no dia da eleição fica condicionado ao deferimento do registro do candidato”. Parece óbvio que o candidato cujo registro esteja “sub judice ” é aquele que que ainda não obteve decisão definitiva da Justiça Eleitoral sobre seu registro, certo? Se essa é a definição de candidato “sub judice”, todo voto dado a candidato que tivesse seu registro indeferido deveria ser inválido e ineficaz para todos os efeitos, não é, e-leitor? Para o TSE, não. Não me olhe assim. Eu concordo com você, e explico o motivo. 

Considera o TSE aplicável (ainda) o art. 175, § 4º , do Código Eleitoral. A norma assevera que a nulidade dos votos dados a candidatos inelegíveis ou não registrados não se aplica quando a decisão de inelegibilidade ou de cancelamento de registro por proferida após a realização da eleição. Deferido o registro, ainda que provisoriamente, antes da eleição, permite o TSE que os votos sejam contados para a legenda, o que gera reflexos no quociente partidário e na quantidade de vagas nas eleições proporcionais(para deputados e vereadores) que o partido conquistará. Qual o problema da tese? Ignorar o alcance da norma do art. 16-A, que revogou claramente o art. 175, § 4º do Código Eleitoral. Eis a posição do TSE: 

Eleições 2012. [...]. Recurso contra expedição de diploma. Eleições proporcionais. Candidata cassada. Cômputo de votos para a legenda. Art. 175, § 4º, do Código Eleitoral. [...]. 1. Os votos obtidos por candidato, cujo registro encontrava-se deferido na data do pleito eleitoral, não são anulados, mas contados a favor da legenda pela qual o parlamentar posteriormente cassado se candidatou, por força do disposto no art. 175, § 4º, do Código Eleitoral. [...]. 2. A norma constante do art. 16-A, parágrafo único, da Lei n° 9.504/97, introduzido pela Lei n° 12.034/09, não afastou a aplicação do art. 175, § 4°, do Código Eleitoral, e sim inseriu na legislação eleitoral um entendimento que já havia sido adotado pela jurisprudência da Corte em julgados anteriores à vigência do referido dispositivo. [...](Ac. de 29.4.2014 no AgR-REspe nº 74918, rel. Min. Dias Toffoli; no mesmo sentido o Ac. de 5.6.2012 no MS 139453, Min. Marco Aurélio.)

Segundo o art. 121 da CF,  lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais. Até hoje, a  Lei Complementar não foi publicada, razão pela qual as normas do Código Eleitoral que tratam sobre organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais foram recepcionadas como se lei complementar fossem. As demais normas do Código Eleitoral, como o citado art. 175, não ostentam essa força. Poderão, portanto, ser revogadas por normas que ocupem o mesmo patamar na pirâmide normativa kelseniana e lhe sejam posteriores. Em outros termos: lei ordinária que trate de matéria do Código Eleitoral abarcada por normas não tenham recepcionadas como lei complementar poderá revogá-las. O art. 16-A é “lex posteriori” em relação ao art. 175, §4°, do Código Eleitoral e que o revogou ao regular inteiramente  matéria nele versada (art. 2°, §1°, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro). Claramente, o 16-A não faz nenhuma diferença entre os candidatos “sub judice” ao afirmar “o cômputo, para o respectivo partido ou coligação, dos votos atribuídos ao candidato cujo registro esteja sub judice no dia da eleição fica condicionado ao deferimento do registro do candidato”. Não importa que antes da eleição o candidato tenha obtido decisão recorrível deferindo-lhe o recurso. O que é relevante é que o processo relativo ao registro não tenha findado, pouco importando se o “sub judice” já obteve alguma decisão não definitiva sobre  o registro.
É possível ao legislador dar eficácia a ato nulo. Poderia, portanto, a lei tornar eficaz o voto dado a quem não teve o registro deferido e disputou a eleição. Entretanto, se a lei não o fez, o intérprete, aqui incluído o TSE, não poderia fazê-lo em nenhuma hipótese. Tendo o art. 16-A revogado o parágrafo quarto do art. 175 do Código Eleitoral, não há norma a amparar a posição da jurisprudência permitindo o aproveitamento dos votos dados aos “sem registro” pela legenda para fins de conformação do quociente partidário. 

A posição do TSE ofende ainda os parâmetros interpretativos postos no art. 14, parágrafo nono, da CF/88, ao reduzir o alcance das inelegibilidades que buscam proteger a probidade e a moralidade administrativa. Será possível a candidato que incida nas inelegibilidades prevista na LC 64/90, tê-las reconhecidas pela Justiça Eleitoral no momento do registro, e ainda assim, ver seus votos serem contabilizados ao partido, apenas porque juiz de primeiro grau deferiu provisoriamente o registro antes do pleito. Caso o juiz deferisse o registro no dia seguinte à eleição, ou o indeferisse, a solução seria diversa. 

O fundamento para a tese do TSE é  a suposta dificuldade de alterar o quociente partidário a depender do resultado do julgamento da justiça eleitoral. De fato, há esse inconveniente, mas é um que deveríamos suportar em respeito à eficácia de normas regedoras de inelegibilidade da LC 64/90 que buscam proteger valores constitucionais. Ora, o mesmo problema não está presente quando o registro é indeferido antes da eleição e a situação não é revertida nas instâncias superiores? Para o TSE, nessa hipótese os votos são nulos para a legenda

Cassação de registro de candidato antes da eleição. Nulidade dos votos. Cassado o registro do candidato antes da eleição, e não revertida essa situação nas instâncias superiores, os votos são nulos, para todos os efeitos, inclusive para a legenda, nos termos do § 3º do art. 175 do Código Eleitoral, pouco importando a atribuição de efeito suspensivo a recurso interposto contra aquela decisão. (Ac. de 27.11.2007 no REspe nº 26.089, rel. Min. Arnaldo Versiani)

No voto proporcional, o eleitor vota às cegas, como já provamos, pois o voto dado num candidato será aproveitado por outro. Graças ao TSE, um voto dado num “não-candidato”, aquele que não teve registro, será usado para eleger outra pessoa. Lembremos que só é candidato quem obtém o registro. O art. 16-A torna sem vida voto dado ao político que não obteve o registro. Para o TSE, no entanto, tal voto seria uma espécie de zumbi, saído da tumba para ter eficácia no que toca à legenda e ao quociente partidário. E vc achando que “the walking dead” era só uma série...

terça-feira, 12 de abril de 2016

Impeachment e TSE

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Olá, e-leitor(a)! Confuso sobre o impeachment? Quer saber quem será o novo presidente do Brasil se a Dilma for afastada? Ouviu falar sobre ações em face de Dilma e Temer no TSE mas não sabe ainda quais serão as consequências de seu julgamento? Seus problemas acabaram! Organizações Tabaja.... Resolvamos suas dúvidas! A seguir, elenco as principais perguntas que assombraram o eleitorado e que me foram enviada pelo twitter @rodrigoatenorio ou pelo blog www.rodrigotenorio.com.br

1)    Comissão Especial da Câmara aprovou por 38 a 27 o parecer do relator pela autorização da abertura do processo de impeachment a partir de denúncia contra a presidente apresentada por advogados. O que acontecerá agora?

Compete à Câmara dos Deputados autorizar a instauração do processo (art. 51 I, da CF/88). Se 2/3  dos deputados (art. 86 da CF) votarem a favor da instauração, em sessão marcada para próximo Domingo, o processo segue para o Senado.

2)    Dilma será afastada no Domingo se 2/3 dos deputados voltarem pela abertura do processo?

Não. Segundo já decidiu o STF(ADPF 368), Dilma só será afastada se o Senado ratificar a abertura do processo de impeachment. Como afirmado pelo STF, “ao Senado compete, privativamente, processar e julgar o Presidente (art. 52, I, da CF), locução que abrange a realização de um juízo inicial de instauração ou não do processo, isto é, de recebimento ou não da denúncia autorizada pela Câmara”. O quórum para essa ratificação é o de maioria simples.


3)    Se o Senado afastar a presidente, quem assume?

O vice-presidente Michel Temer(art. 79 da CF)

4)    Se Michel Temer assumir a presidência, Eduardo Cunha será seu vice-presidente?

Não. Essa afirmação foi feita equivocadamente ontem por diversos deputados da comissão especial da Câmara. Cunha, atual Presidente da Câmara dos Deputados, será o próximo da linha sucessória(art. 80 da CF), mas isso não significa que será o vice. O vice não é só quem substitui eventualmente o presidente, mas aquele que o sucederá no caso de vaga. Ademais, auxiliará o Presidente sempre que convocado para missões especiais e exercerá outras atribuições conferidas por lei complementar (art. 79 da CF). Se Temer for afastado, Cunha não virará presidente. Haverá novas eleições diretas pelo eleitorado brasileiro, salvo se a vacância se der nos últimos dois anos do (art. 81, §1º). Nessa hipótese, a eleição será indireta, pelo Congresso Nacional.


5)    O TSE poderá cassar a presidente?

O TSE poderá cassar não só Dilma, mas toda a chapa da qual a presidente faz parte, a qual inclui também o vice-presidente Michel Temer. Conforme o art. 77, §, da CF/88, a eleição do Presidente da República importará a do Vice-Presidente com ele registrado. A união de presidente e vice vale na alegria e na tristeza: juntos na eleição, juntos na cassação. Isso só não vale para o impeachment. Há quatro ações no TSE para cassar o mandato presidencial, afastando Dilma e Temer do poder: Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, 761, Ação de Investigação Judicial Eleitoral 194358, Ação de Investigação Judicial Eleitoral 154781 e Representação 846. As causas de pedir dessas ações englobam abuso de poder econômico, político, prática de condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais (art. 73 da Lei 9503/97) e práticas de  condutas em desacordo com as normas da Lei das Eleições relativas à arrecadação e gastos de recursos usados na campanha.

6)    Se o TSE cassar o mandato presidencial, afastando Dilma e Temer, o que ocorrerá?
Aplica-se o art. 81 da Constituição, de acordo com o qual  “vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga”. A eleição será direta, salvo se a vacância se der nos últimos dois anos do mandato presidencial(art. 81, §1º). Nessa hipótese, a eleição será indireta, trinta dias depois da cassação, pelo Congresso Nacional, na forma lei.

Ainda em dúvida? Mandem suas questões!  

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Boa notícia: STF suspende norma que permite doação eleitoral oculta



Abaixo, a notícia do site do STF:

Quinta-feira, 12 de novembro de 2015
Suspensa norma que permitia doações anônimas a candidatos
Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deferiu pedido de liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5394 para suspender a eficácia de dispositivo da Lei Eleitoral (9.504/1997) que permitia doações ocultas a candidatos. A ação foi ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sob a alegação de que o dispositivo impugnado viola os princípios da transparência, da moralidade e favorece a corrupção, dificultando o rastreamento das doações eleitorais. A regra vale já para as eleições municipais de 2016.

Os ministros decidiram pela suspensão da expressão “sem individualização dos doadores”, constante do parágrafo 12 do artigo 28 da Lei Eleitoral, acrescentado pelo artigo 2º da Lei Federal 13.165/2015, que instituiu as chamadas “doações ocultas”, aquelas em que não é possível identificar o vínculo entre doadores e candidatos. A decisão tem eficácia ex tunc, ou seja, desde a sanção da lei.
Em voto pela concessão da liminar, o relator da ADI 5394, ministro Teori Zavascki, entende não haver justificativa para a manutenção das doações ocultas que retiram transparência do processo eleitoral e dificultam o controle de contas pela Justiça Eleitoral. Para o ministro, a norma impugnada, ao introduzir as doações ocultas, permite que doadores de campanha ocultem ou dissimulem seus interesses em prejuízo do processo eleitoral.
No entendimento do relator, o dispositivo impugnado retira transparência do processo eleitoral, frustra o exercício adequado das funções da Justiça Eleitoral e impede que o eleitor exerça com pleno esclarecimento seus direitos políticos. Esses motivos, além da proximidade do ciclo eleitoral de 2016, salienta, são mais que suficientes para caracterizar a situação de prioridade para o STF deferir a cautelar para suspender a norma.
“Ao determinar que as doações feitas a candidatos por intermédio de partidos sejam registradas sem a identificação dos doadores originários, a norma institui uma metodologia contábil diversionista, estabelecendo uma verdadeira cortina de fumaça sobre as declarações de campanha e positivando um controle de fantasia. Pior, premia um comportamento elusivo dos participantes do processo eleitoral e dos responsáveis pela administração dos gastos de campanha. Isso atenta contra todo um bloco de princípios constitucionais que estão na medula do sistema democrático de representação popular”, ressaltou.
Segundo ele, esses dados possuem valor não apenas após as eleições, na forma de um diagnóstico final da arrecadação e dos gastos realizados, mas especialmente antes de sua realização, quando os eleitores ainda podem alterar sua opção de voto. Em seu entendimento, essas informações são essenciais para habilitar o eleitor a fazer um prognóstico mais realista da confiabilidade das promessas de campanha.
“Afinal, o conhecimento dos nomes dos doadores ilumina conexões políticas facilmente subtraídas do público nos discursos de campanha, denunciando a maior ou menor propensão dos candidatos e partidos a abandonar suas convicções ideológicas em posturas de pragmatismo político questionáveis, como o fisiologismo, que, se conhecidas de antemão, poderiam sofrer a rejeição do eleitorado”, assinalou.
O ministro destacou que a divulgação das informações, além de beneficiar a democracia ao permitir decisão de voto mais informada, possibilita o aperfeiçoamento das políticas legislativas de combate à corrupção eleitoral ajudando a denunciar as fragilidades do modelo e inspirando proposta de correção. Frisou ainda que a transparência é um instrumento fundamental ao acesso à informação, exigível a todas as instâncias da administração pública, mas especialmente na regulamentação das eleições, inclusive por força da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, internalizada pelo Brasil em 2006.
“O retrocesso é bem mais significativo que o desfalque instrumental nas prestações de contas. Na verdade, ele enseja o amesquinhamento das condições ideais para a fruição de uma experiência eleitoral verdadeiramente democrática”, finalizou.
O ministro Marco Aurélio votou pelo deferimento da liminar, porém com eficácia ex nunc (que não retroage) da decisão.
PR/FB
 

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

STF - Informativo 801 - Matérias eleitorais

No último informativo do STF, há dois casos de interesse aos operadores do Direito Eleitoral. O primeiro deles é o indeferimento de pleito feito em medida cautelar em ADI (ADI 5311-MC/DF, Rel. Min. Carmém Lúcia), para suspender a eficácia do art 2 da Lei 131107/2015, no trecho em que altera os arts. 7º e 29 d Lei dos Partidos Políticos. O segundo consiste no julgamento procedente do pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 1º e 2º da Lei 12.875/2013. Tais dispositivos, ao promoverem alterações nas Leis 9.096/1995 e 9.504/1997, restringem, aos novos partidos políticos, criados após a realização das eleições para a Câmara dos Deputados, qualquer acesso aos recursos do Fundo Partidário, bem como qualquer tempo destinado a propaganda eleitoral. Abaixo, a cópia do informativo: 
 
Partidos políticos: apoiamento de eleitores não filiados e limite temporal para fusão - 1

O Plenário, por maioria, indeferiu pedido formulado em medida cautelar em ação direita de inconstitucionalidade, ajuizada em face do art. 2º da Lei 13.107/2015, na parte que alterara os artigos 7º e 29 da Lei dos Partidos Políticos [“Art. 2º Os arts. 7º, 29 e 41-A da Lei no 9.096, de 19 de setembro de 1995, passam a vigorar com as seguintes alterações: ‘Art. 7º § 1º Só é admitido o registro do estatuto de partido político que tenha caráter nacional, considerando-se como tal aquele que comprove o apoiamento de eleitores não filiados a partido político, correspondente a, pelo menos, 0,5% (cinco décimos por cento) dos votos dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não computados os votos em branco e os nulos, distribuídos por 1/3 (um terço), ou mais, dos Estados, com um mínimo de 0,1% (um décimo por cento) do eleitorado que haja votado em cada um deles.’ ‘Art.29 (...) § 9º Somente será admitida a fusão ou incorporação de partidos políticos que hajam obtido o registro definitivo do Tribunal Superior Eleitoral há, pelo menos, 5 (cinco) anos.’”]. O Tribunal esclareceu que a Constituição asseguraria a liberdade de criação, fusão, extinção e incorporação de partidos políticos, como expressão do princípio democrático e do pluripartidarismo (CF, art. 17). Portanto, estaria garantida no ordenamento jurídico-constitucional a liberdade dos partidos políticos de se articularem, desde que observada a imperatividade do caráter nacional das agremiações — controle quantitativo — e do cunho democrático de seus programas — controle qualitativo ou ideológico. Destacou que a necessidade de aperfeiçoamento do controle quantitativo e qualitativo dos partidos justificaria o advento das normas impugnadas. Observou que haveria agremiações intituladas formalmente como partidos políticos sem qualquer substrato eleitoral. Essas legendas estariam habilitadas a receber parcela do fundo partidário e a disputar tempo de televisão sem difundir, contudo, ideias e programas. Elas atuariam em deferência a outros interesses partidários, especialmente para obtenção de vantagens particulares para os seus dirigentes. Esses partidos seriam objeto de comércio em que se venderiam interesses e se pagaria com futuro.
ADI 5311-MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 30.9.2015. (ADI-5311)

Partidos políticos: apoiamento de eleitores não filiados e limite temporal para fusão - 2

A Corte asseverou que a imperatividade de urgente legitimação dos partidos também decorreria de seu acesso ao Fundo Partidário, dinheiro público a que fariam jus. As verbas desse Fundo teriam assumido importância nuclear para a sobrevivência dos partidos e, mesmo em tempos de depressão econômica, houvera vultoso aumento desses valores. Assim, o aperfeiçoamento dos mecanismos de controle quantitativo e qualitativo na formação dos partidos, buscado na legislação questionada, assumiria também a função de tutela do princípio da eficiência administrativa dos recursos públicos, na medida em que, sem coibir a formação de novas agremiações, lhes atribuiria maior expressividade, de modo a estancar gastos públicos vultosos, seja na repartição do fundo partidário, seja pelo acesso aos horários de propaganda em rádio e televisão, também subsidiados pelo contribuinte. Frisou que a proliferação indiscriminada de partidos sem coerência ou respaldo social importaria em risco institucional e conduziria ao desalento democrático. Além disso, poderia transformar o sadio pluripartidarismo em caos político. Salientou que as normas analisadas teriam como fundamento a tentativa de incentivar a utilização de mecanismos da democracia representativa, a reforçar a legitimidade e o compromisso do eleitor e do partido no qual se depositara o seu aval. Ademais, a fidelidade partidária irradiaria efeitos a alcançar todos os filiados, já que as exigências democráticas que vinculariam o funcionamento interno dos partidos atingiriam não apenas os filiados mandatários como também a base. Realçou que a limitação criada pela norma em análise, quanto ao apoio para a criação de novos partidos, a qual ficaria restrita aos cidadãos sem filiação partidária, estaria em conformidade com o regramento constitucional relativo ao sistema representativo.
ADI 5311-MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 30.9.2015. (ADI-5311)

Partidos políticos: apoiamento de eleitores não filiados e limite temporal para fusão - 3

O Tribunal consignou, ainda, que a exigência temporal para se levar a efeito fusões e incorporações entre partidos asseguraria o atendimento do compromisso do cidadão com a sua opção partidária, o que evitaria o estelionato eleitoral ou a reviravolta política contra o apoio dos eleitores, então filiados. Na espécie, a norma distinguiria cidadãos filiados e não filiados para o exclusivo efeito de conferência de legitimidade do apoio oferecido à criação de novos partidos políticos. O objetivo único seria a garantia de coesão, coerência e substância ao modelo representativo instrumentalizado pela atuação partidária. Trataria, portanto, de cidadãos distintos em seu exercício cívico, livre em relação a suas opções políticas. Assim sendo, constitucionalmente livres, não seriam civicamente irresponsáveis nem descomprometidos com as suas escolhas formalizadas. Além disso, o descompromisso com a atuação política atingiria todos em uma sociedade. A disseminação de práticas antidemocráticas que iriam desde a compra e venda de votos ao aluguel de cidadãos e de partidos inteiros deveriam ser combatidas pelo legislador, sem prejuízo da autonomia partidária. Portanto, as normas objurgadas tenderiam a enfraquecer essa lógica mercantilista e nada republicana de prática política. Concluiu que não se teria demonstrado, na hipótese dos autos, ingerência estatal na autonomia constitucional dos partidos políticos. Vencido o Ministro Dias Toffoli, que concedia a medida cautelar para suspender, com efeito “ex nunc”, a eficácia dos dispositivos atacados por julgá-los incompatíveis com a disciplina do art. 17 da CF.
ADI 5311-MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 30.9.2015. (ADI-5311)


Audio

Partidos políticos: direito de antena, acesso ao Fundo Partidário e ativismo congressual - 1

O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 1º e 2º da Lei 12.875/2013, que, ao promoverem alterações nas Leis 9.096/1995 e 9.504/1997, restringem, aos novos partidos políticos, criados após a realização das eleições para a Câmara dos Deputados, qualquer acesso aos recursos do Fundo Partidário, bem como qualquer tempo destinado a propaganda eleitoral. De início, o Colegiado destacou que as disposições ora impugnadas decorreriam de superação legislativa da interpretação conferida pelo STF ao art. 47, § 2º, II, da Lei 9.504/1997 (ADI 4.430/DF, DJe de 19.9.2013 e ADI 4.795/DF, DJe de 30.10.2013). Na oportunidade, o Tribunal dera interpretação conforme ao preceito questionado, para salvaguardar aos partidos novos, criados após a realização de eleições para a Câmara dos Deputados, o direito de acesso proporcional aos dois terços do tempo destinado à propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão. Poucos meses após o julgamento dos casos supracitados, o Congresso editara a Lei 12.875/2013 que, em sentido oposto ao pronunciamento da Corte, subtraíra dessas novas legendas o acesso aos recursos do Fundo e ao direito de antena. Caberia perquirir, portanto, quais os limites de reações legislativas a decisões proferidas pelo STF, tendo em vista o impacto na esfera de liberdade de conformação do legislador. Nesse sentido, o Tribunal deteria a última palavra no que se refere à interpretação da Constituição, imune a qualquer controle democrático. Não se ignoraria, entretanto, a legitimidade, em algumas hipóteses, do ativismo congressual, ou seja, de reversão legislativa a decisões da Corte, desde que observadas algumas balizas constitucionais. Nesses casos, o Legislativo buscaria reverter situações de autoritarismo judicial ou de comportamento antidialógico, incompatível com a separação de poderes. Ao legislador seria, assim, franqueada a capacidade de interpretação da Constituição, a despeito de decisões de inconstitucionalidade proferidas pelo STF. Seria possível extrair as seguintes conclusões a respeito do tema: a) o Tribunal não subtrai “ex ante” a faculdade de correção legislativa pelo constituinte reformador ou pelo legislador ordinário; b) no caso de reversão jurisprudencial via emenda constitucional, a invalidação somente ocorrerá nas hipóteses estritas de ultraje aos limites do art. 60 da CF; e c) no caso de reversão jurisprudencial por lei ordinária, excetuadas as situações de ofensa evidente ao texto constitucional, a Corte tem adotado comportamento de autorrestrição e de maior deferência às opções políticas do legislador.
ADI 5105/DF, rel. Min. Luiz Fux, 1º.10.2015. (ADI-5105)

Partidos políticos: direito de antena, acesso ao Fundo Partidário e ativismo congressual - 2

O Tribunal assinalou que seria prudente não se atribuir a qualquer órgão, fosse do Judiciário, fosse do Legislativo, a faculdade de pronunciar, em solução de definitividade, a última palavra sobre o sentido da Constituição. O próprio texto constitucional desafiaria esse entendimento. Em primeiro lugar, os efeitos vinculantes das decisões proferidas em sede de controle abstrato não atingem o Legislativo (CF, artigos 102, § 2º; e 103-A), de modo a ser perfeitamente possível a edição de emendas constitucionais ou leis ordinárias acerca do assunto objeto de pronunciamento judicial. Em segundo lugar, o dever de fundamentação das decisões judiciais (CF, art. 93, IX), impõe que o STF, mesmo nas hipóteses de correção legislativa de sua jurisprudência, enfrente a controvérsia à luz dos novos argumentos expendidos pelo legislador para reverter o precedente. Além disso, desconsiderar que as demais instituições sejam intérpretes autorizados da Constituição poderia propiciar certa acomodação ou desinteresse nos demais atores em interpretar o texto constitucional. Ademais, a perspectiva juriscêntrica de hermenêutica constitucional também estimula comportamentos irresponsáveis na conformação da Constituição pelo legislador. Assim, o STF deveria proceder como catalisador deliberativo, promovendo a interação e o diálogo institucional, de modo a maximizar a qualidade democrática na obtenção dos melhores resultados em termos de apreensão do significado constitucional. Portanto, o legislador poderia, por emenda constitucional ou lei ordinária, superar a jurisprudência, reclamando posturas distintas da Corte. Se veiculada por emenda, altera-se o próprio parâmetro amparador da jurisprudência. Nessas situações, a invalidade da emenda somente poderá ocorrer nas hipóteses de descumprimento do art. 60 da CF. Se, porém, introduzida por legislação ordinária, a norma que frontalmente colidir com a jurisprudência do Tribunal nasce com presunção de inconstitucionalidade, de sorte que caberia ao legislador o ônus de demonstrar, argumentativamente, que a correção do precedente se afigura legítima, e que o posicionamento jurisprudencial deve ser superado, tendo em conta novas premissas fáticas e jurídicas. Assim, a novel legislação que frontalmente colidisse com a jurisprudência se submeteria a um escrutínio de constitucionalidade mais rigoroso.
ADI 5105/DF, rel. Min. Luiz Fux, 1º.10.2015. (ADI-5105)

Partidos políticos: direito de antena, acesso ao Fundo Partidário e ativismo congressual - 3

O Colegiado apontou que, no caso em debate, a análise da justificação do projeto de lei que desaguara na norma supracitada revelaria a inaptidão dos fundamentos ali expendidos para legitimar a reversão da interpretação fixada pelo STF na matéria. Os fundamentos seriam: a) as migrações que ocorrem durante a legislatura vulneram a previsibilidade institucional na distribuição dos recursos dos fundos partidários e do horário de propaganda; b) essas alterações geram um cenário de insegurança jurídica; c) a medida legislativa visa a valorizar os partidos políticos, de modo a evitar disfunções no sistema partidário; d) perenidade do partido enquanto instrumento do pluralismo político; e e) o art. 17, § 3º, da CF seria observado com a distribuição equitativa dos 5% dos recursos do Fundo Partidário e do 1/3 do horário de propaganda eleitoral. Não haveria, no projeto, enfrentamento aos fundamentos das ações diretas de inconstitucionalidade referidas, e os argumentos não seriam capazes de infirmar a tese então exarada pela Corte. Na oportunidade, o Plenário asseverara que o art. 17 da CF, que consagra o direito político fundamental da liberdade de criação de partidos, tutela, igualmente, as agremiações que tenham representação no Congresso, sendo irrelevante perquirir se essa representatividade resulta da criação de nova legenda no curso da legislatura. Além disso, também ficara consignado que erigir a criação de novos partidos como hipótese caracterizadora de justa causa para as migrações partidárias, somada ao direito constitucional de livre criação de novas legendas, impõe a conclusão inescapável de que é defeso privar as prerrogativas inerentes à representatividade política do parlamentar. Por sua vez, a justificação do projeto de lei se limitara a afirmar, genericamente, que a regulamentação da matéria, excluindo dos partidos criados o direito de antena e o Fundo Partidário, fortaleceria as agremiações, sem enfrentar os fundamentos das ações diretas. Portanto, a inconstitucionalidade das normas em questão se agrava, porquanto a decisão do STF fora ancorada em sólida construção argumentativa calcada em cláusulas pétreas. Em tese, a nova legislação que afrontasse decisões do Tribunal nasceria com presunção relativa de inconstitucionalidade, mas, na espécie, a inconstitucionalidade da lei seria evidente.
ADI 5105/DF, rel. Min. Luiz Fux, 1º.10.2015. (ADI-5105)

Partidos políticos: direito de antena, acesso ao Fundo Partidário e ativismo congressual - 4

O Plenário reputou, também, que as normas em debate seriam inconstitucionais por afrontarem as condições de funcionamento das instituições democráticas. A restrição imposta pela nova lei às novas legendas justificaria a intervenção do STF, pois se cuidaria de tentativa de inviabilizar os canais de acesso e de participação daqueles que estão fora do jogo democrático. Seria dever da Corte otimizar e aperfeiçoar o processo democrático, de sorte a: a) corrigir as patologias que desvirtuem o sistema representativo, máxime quando obstruam as vias de expressão e os canais de participação política; e b) proteger os interesses e direitos dos grupos políticos minoritários, cujas demandas dificilmente encontram eco nas deliberações majoritárias. A discussão acerca dos critérios de distribuição dos recursos do Fundo Partidário e do horário de propaganda eleitoral encerram importantes ferramentas de viabilização e desenvolvimento dessa engenharia democrática, impactando decisivamente no pleito eleitoral. Com a imposição de severas limitações ao Fundo Partidário e ao direito de antena, as novas agremiações seriam alijadas do processo político. Por esses motivos, a reação jurisprudencial materializada na Lei 12.875/2013, ao subtrair dos partidos novos, criados no curso da legislatura, o direito de antena e o acesso a recursos do Fundo Partidário remanesceria eivada de inconstitucionalidade, na medida em que, além de o legislador não ter logrado trazer novos e consistentes fundamentos para infirmar o pronunciamento da Corte, o diploma inviabiliza, no curto prazo, o funcionamento e o desenvolvimento de minorias político-partidárias, em ofensa aos postulados do pluralismo político e da liberdade partidária (CF, art. 17, § 3º). Vencidos os Ministros Edson Fachin, Teori Zavascki, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski (Presidente), que julgavam o pedido improcedente.
ADI 5105/DF, rel. Min. Luiz Fux, 1º.10.2015. (ADI-5105)

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Decisão de órgãos regionais dos conselhos profissionais pode gerar inelegibilidade?


A pergunta me foi feita por conta por conta do regramento relativo aos Conselhos Regionais de Medicina e ao Conselho Federal de Medicina. Não há dúvidas quanto à possibilidade de aplicação da sanção pelas seccionais a OAB, uma vez que a Lei 8906/94 prevê, no parágrafo único do art. 38 ,que "para a aplicação da sanção disciplinar de exclusão é necessária a manifestação favorável de dois terços dos membros do  Conselho Seccional competente". Já os Conselhos Regionais de Medicina têm atribuição para impor a sanção de "cassação do exercício profissional, ad referendum do Conselho Federal", por disposição expressa do art. 22, "e", da Lei 3268. O Decreto 44045/58, que regulamentou a Lei 3268, aponta, no art. 21, que  recurso "ex-officio" será obrigatório nas decisões dos CRMs de que resultar cassação da autorização para o exercício profissional. O atual Código de Processo Ético Profissional do CFM(Resolução CFM 1897/2009), no art. 50, V, prevê recurso "ex officio" ao Pleno do CRM - e não ao CFM - das decisões de cassação do exercício profissional proferidas pelas Câmaras, o órgão julgador fracionário. Ainda segundo a Res. 1897, caberá sempre "revisão",  pelo Conselho Federal de Medicina(art.50, V) ,  instrumento parecido com a "revisão" prevista no art. 31 da Lei Orgânica do do TCU, e que  só pode ser manejado contra decisão definitiva.  Como se vê, a o Código de Processo Ético Profissional está em desacordo com a Lei 3268. Essa consagra a necessidade de manifestação do CFM nas hipótese da exclusão do exercício da profissão, enquanto aquele não o faz. Entretanto, em vista do posicionamento dos tribunais, a discussão é irrelevante na seara eleitoral. O TSE em 2012 afirmou que "eventuais vícios procedimentais que contaminem a decisão que culminou na exclusão do candidato do exercício da profissão não são passíveis de análise pela Justiça Eleitoral no processo de registro de candidatura, sem prejuízo de eles serem alegados em sede própria para que, a partir da obtenção de provimento judicial do órgão competente, a inelegibilidade prevista na alínea m do inciso I do art. 1º da Lei Complementar nº 64/90 possa ser afastada" (RESPE 34430). Se foi expulso pelo CRM - e não pelas Câmaras - o (ex)-médico estará, para todos os efeitos, inelegível.

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