
Considera o TSE aplicável (ainda) o
art. 175, § 4º , do Código Eleitoral. A norma assevera que a nulidade
dos votos dados a candidatos inelegíveis ou não registrados não se aplica quando
a decisão de inelegibilidade ou de cancelamento de registro por proferida após
a realização da eleição. Deferido o registro, ainda que provisoriamente, antes
da eleição, permite o TSE que os votos sejam contados para a legenda, o que
gera reflexos no quociente partidário e na quantidade de vagas nas eleições
proporcionais(para deputados e vereadores) que o partido conquistará. Qual o
problema da tese? Ignorar o alcance da norma do art. 16-A, que revogou
claramente o art. 175, § 4º do Código Eleitoral. Eis a posição do TSE:
Eleições
2012. [...]. Recurso contra expedição
de diploma. Eleições proporcionais. Candidata cassada. Cômputo
de votos
para a legenda. Art. 175, § 4º, do Código Eleitoral. [...]. 1. Os votos obtidos
por candidato, cujo registro encontrava-se deferido
na data do pleito eleitoral, não são anulados, mas contados a favor da legenda
pela qual o parlamentar posteriormente
cassado se candidatou, por força do disposto no art. 175, § 4º, do Código Eleitoral. [...]. 2. A norma constante do
art. 16-A, parágrafo único, da Lei n°
9.504/97, introduzido pela Lei
n° 12.034/09, não afastou a aplicação do
art. 175, § 4°, do Código Eleitoral,
e sim inseriu na legislação
eleitoral
um entendimento
que já havia sido adotado pela
jurisprudência da Corte em julgados
anteriores à vigência do referido
dispositivo. [...](Ac.
de 29.4.2014 no AgR-REspe
nº 74918, rel. Min. Dias Toffoli;
no mesmo sentido
o Ac.
de 5.6.2012 no MS 139453, Min. Marco
Aurélio.)
Segundo o art. 121 da CF, lei complementar disporá sobre a organização
e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais. Até
hoje, a Lei Complementar não foi
publicada, razão pela qual as normas do Código Eleitoral que tratam sobre
organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas
eleitorais foram recepcionadas como se lei complementar fossem. As demais
normas do Código Eleitoral, como o citado art. 175, não ostentam essa força.
Poderão, portanto, ser revogadas por normas que ocupem o mesmo patamar na
pirâmide normativa kelseniana e lhe sejam posteriores. Em outros termos: lei
ordinária que trate de matéria do Código Eleitoral abarcada por normas não
tenham recepcionadas como lei complementar poderá revogá-las. O art. 16-A é “lex
posteriori” em relação ao art. 175, §4°, do Código Eleitoral e que o revogou ao
regular inteiramente matéria nele
versada (art. 2°, §1°, da
Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro). Claramente, o 16-A não faz
nenhuma diferença entre os candidatos “sub judice” ao afirmar “o cômputo, para o respectivo partido ou
coligação, dos votos atribuídos ao candidato cujo registro esteja sub judice no
dia da eleição fica condicionado ao deferimento do registro do candidato”. Não importa que antes da eleição o
candidato tenha obtido decisão recorrível deferindo-lhe o recurso. O que é
relevante é que o processo relativo ao registro não tenha findado, pouco
importando se o “sub judice” já obteve alguma decisão não definitiva sobre o registro.
É possível ao legislador dar eficácia
a ato nulo. Poderia, portanto, a lei tornar eficaz o voto dado a quem não teve
o registro deferido e disputou a eleição. Entretanto, se a lei não o fez, o
intérprete, aqui incluído o TSE, não poderia fazê-lo em nenhuma hipótese. Tendo
o art. 16-A revogado o parágrafo quarto do art. 175 do Código Eleitoral, não há
norma a amparar a posição da jurisprudência permitindo o aproveitamento dos
votos dados aos “sem registro” pela legenda para fins de conformação do
quociente partidário.
A posição do TSE ofende ainda os
parâmetros interpretativos postos no art. 14, parágrafo nono, da CF/88, ao
reduzir o alcance das inelegibilidades que buscam proteger a probidade e a
moralidade administrativa. Será possível a candidato que incida nas
inelegibilidades prevista na LC 64/90, tê-las reconhecidas pela Justiça
Eleitoral no momento do registro, e ainda assim, ver seus votos serem
contabilizados ao partido, apenas porque juiz de primeiro grau deferiu provisoriamente
o registro antes do pleito. Caso o juiz deferisse o registro no dia seguinte à
eleição, ou o indeferisse, a solução seria diversa.
O fundamento para a tese do TSE
é a suposta dificuldade de alterar o
quociente partidário a depender do resultado do julgamento da justiça
eleitoral. De fato, há esse inconveniente, mas é um que deveríamos suportar em
respeito à eficácia de normas regedoras de inelegibilidade da LC 64/90 que
buscam proteger valores constitucionais. Ora, o mesmo problema não está
presente quando o registro é indeferido antes da eleição e a situação não é
revertida nas instâncias superiores? Para o TSE, nessa hipótese os votos são nulos
para a legenda
Cassação
de registro
de candidato antes da eleição. Nulidade
dos votos. Cassado o registro do
candidato antes da eleição,
e não revertida
essa situação nas instâncias superiores,
os votos são nulos, para todos os efeitos, inclusive para a legenda, nos termos do § 3º do art. 175 do Código Eleitoral,
pouco importando a atribuição de efeito
suspensivo a recurso interposto
contra aquela decisão. (Ac. de 27.11.2007 no REspe nº 26.089, rel. Min.
Arnaldo Versiani)
No voto proporcional, o eleitor vota
às cegas, como já provamos, pois o voto dado num candidato será aproveitado por
outro. Graças ao TSE, um voto dado num “não-candidato”, aquele que não teve
registro, será usado para eleger outra pessoa. Lembremos que só é candidato quem
obtém o registro. O art. 16-A torna sem vida voto dado ao político que não
obteve o registro. Para o TSE, no entanto, tal voto seria uma espécie de zumbi,
saído da tumba para ter eficácia no que toca à legenda e ao quociente
partidário. E vc achando que “the walking dead” era só uma série...
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